Sábado Santo 2009

Laurence Freeman OSB
Traduzido por Roldano Giuntoli

“O que está acontecendo? Há hoje um grande silêncio sobre a terra, um grande silêncio e imobilidade, um grande silêncio porque o Rei dorme”. O autor cristão do segundo século que escreveu estas palavras para o Sábado Santo, compreendia o significado do silêncio e da imobilidade. Hoje é um dia de expectativa prenhe. Sabemos que algo está para acontecer, mas não temos o poder de fazê-lo acontecer ou de controlar o tempo do acontecimento. Podemos escolher entre esperar em paz, acreditando ou permitir que o ego impaciente nos controle e agite inutilmente nossa mente, tal como acontece estando sentados em meio a um engarrafamento de tráfego, quando podemos utilizar o tempo para a diligente prece ou para nos lançarmos a um frenesi.

Os três dias do Tríduo simbolizam aspectos de nossa jornada de meditação. Na Quinta celebramos o grande banquete, com os amigos, em comunhão. Havia a sombra do ego, assim como em quase todos os afazeres humanos. Porém, o sentimento dominante era a alegria e a confiança na auto-entrega de Jesus. Com a Sexta, passamos do banquete à fome, a maré avassaladora da perda e da ausência, na terrível dor da rejeição. Hoje estamos no dia que se segue à tormenta, encarando a expansão do corriqueiro: para ilustrar isso, eu escolhi uma foto do mar aberto, com um pescador em sua canoa solitária. Amanhã, o impossível se realiza. A partir do silêncio e da imobilidade do dia de hoje, acontece a nova criação, tal qual um novo nascimento. Não a vemos acontecer: ela não pode ser vista, porque está dentro de nós e entre nós. Contudo, sentimos seus efeitos e passamos a compreender que uma nova maneira de viver foi colocada à nossa frente.

A meditação também tem seus momentos de banquete, quando a experiência é palpável e a experiência de paz e alegria permeia todas as coisas. Há também os momentos em que o abandono do ego é muito doloroso. O sacrifício da atenção não se refere à destruição, mas à doação. Todavia, trata-se de uma radical doação de si mesmo e isso machuca mais naqueles locais e naqueles momentos em que vai de encontro à nossa mais forte resistência.

Então, também, a meditação é corriqueira. Aprendermos essa maneira e essa prática significa integrá-la à nossa vida diária, sem drama ou contínuo auto-questionamento. Suavemente, ela desliza em algum ponto da familiaridade para os ritmos da vida. Então, caso um dia voce não possa meditar, voce terá a forte sensação de estar faltando algo natural e necessário.

E a Ressurreição? Essa é a nova maneira de reagir às situações, às pessoas e ao nosso próprio caráter, que se fortalece à medida que nossa verdadeira natureza se revela: a verdade acerca de nós mesmos, de que aguardamos a revelação que nos chegará por meio de uma explosão de luz, no seu devido tempo. Uma luz que é o próprio amor.

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