Beda Griffiths OSB (1906-1993)

Prece, além das palavras e pensamentos
Tradução, Roldano Giuntoli

O método de prece que Pe. John descobriu foi aquele de Cassiano e dos Padres do Deserto do século IV.

Cassiano foi um monge que veio de onde hoje é na verdade a Iugoslávia, ele foi à Palestina, a Jerusalém e a Belém e, então, foi visitar os monges nos desertos do Egito. No séc IV, o Egito estava repleto de monges cristãos, que haviam saído do mundo do Império Romano, buscando a Deus no deserto. Ele entrevistou esses monges e, escreveu suas conferências, descrevendo suas vidas e particularmente sua forma de prece. Entre elas, está aquela que versa sobre a prece, pelo Abade Isaac, que se constitui em um ensinamento clássico sobre todo esse assunto da meditação.

O ensinamento sobre a prece da regra de São Bento origina-se em Cassiano e nos Padres do Deserto. Foi isto que o Pe. John descobriu em seu mosteiro de Ealing. Cassiano foi uma das autoridades para São Bento e, a regra de São Bento deriva seus ensinamentos sobre a prece de Cassiano e dos Padres do Deserto.

Isso é o que Pe. John descobriu em seu mosteiro em Ealing. Essa prece, que eles chamavam de prece pura, sem palavras ou pensamentos é o segredo da prece que Pe. John descobriu e, para muitas pessoas, isso é um grande problema, pois, quando pensamos na prece, pensamos nas palavras e nos pensamentos, pensamos no Pai Nosso, pensamos em Deus, e, tudo isso, é claro, é necessário para começarmos, mas, a prece precisa conduzir para além das palavras e, para além dos pensamentos, o que Evágrio, um dos grandes Monges do Deserto, chamou de prece pura. O próprio São Bento menciona a pureza do coração como uma qualidade da prece. Isto é o que estamos buscando, essa prece pura. Pe. John recuperou isso para nós.

Eu mesmo, vivi como monge beneditino por 20 anos na Inglaterra e, nunca a descobri. Não tínhamos essa prática de meditação em nossos mosteiros. Costumávamos meditar por meia hora após as vésperas, mas, não recebíamos nenhuma instrução, nenhuma real orientação nela. Ela só apareceu por volta da época em que Pe. John estava passando essa mensagem, mas, é isso o que as pessoas estão procurando hoje em dia e, eu deveria mencionar este maravilhoso e pequeno livro que muitos de vocês conhecem, Relatos de Um Peregrino Russo, acerca daquele peregrino que percorreu toda a Rússia dizendo a prece de Jesus: Senhor Jesus filho de Deus tende piedade de mim, pecador. Ele havia lido no novo testamento que precisamos rezar sempre, rezar sem cessar, então foi em busca de diferentes mosteiros para perguntar como ele poderia rezar sem cessar e, um staretz, um ancião, lhe ensinou a oração de Jesus, dizendo-lhe para repeti-la mil vezes, duas mil vezes, cinco mil vezes. Assim, ele percorreu toda a Rússia rezando noite e dia e, toda sua vida se transformou, ele irradiava Cristo, uma coisa maravilhosa e, este livro se tornou muito popular, tenho certeza de que muitos de vocês o conhecem e, o recomendo a todos. É interessante hoje em dia, em que o sistema comunista está se desintegrando, e o povo russo está redescobrindo sua alma. No século dezenove a Rússia era a Rússia Sagrada e, esses peregrinos vagueavam por toda a Rússia, por todos os mosteiros, catedrais e igrejas, procurando por Deus e revelando a Deus, e isto hoje, acreditamos, está voltando novamente. É por isso que pergunto o que é que as pessoas estão procurando hoje em dia em todo o mundo? Elas estão acostumadas a rezar com palavras e conceitos que, é claro, são necessários de início.

A maneira tradicional da oração monástica é a Lectio Divina com a qual, tenho certeza, muitos de vocês estão familiarizados: a leitura meditativa da Bíblia. Esta é uma prática excelente que, todavia, dificilmente vai além da prece discursiva, seguindo de pensamento em pensamento. É útil, nos ajuda, mas, não nos leva ao fim. Não é propriamente, ainda, a prece contemplativa. A prece contemplativa começa quando todo pensamento discursivo cessa, quando a mente repousa em silêncio na presença de Deus. Contemplação é a prática da presença de Deus. Pe. John descobriu o mantra, a repetição de uma palavra sagrada, como um caminho para chegar àquela prece contemplativa, àquele silêncio, à presença de Deus.

Aqui, gostaria de fazer uma importante distinção, a de que aprendemos a pensar sobre nós mesmos sempre, como um todo integrado de corpo, alma e espírito. Infelizmente nos acostumamos a pensar no ser humano em termos de corpo, alma, racional, animal, e, isto está bem até certo ponto, mas, isso deixa de fora a mais profunda dimensão de nosso ser e, na Igreja primitiva de São Paulo, você sempre encontra esta distinção básica, de corpo, alma e espírito e, quando rezamos, quando meditamos, não o estamos fazendo apenas em nossa mente. Isso é tão perigoso para nós ocidentais, treinamos tanto nossas mentes, que toda nossa religião está em nossas cabeças, se não tomamos cuidado e, a meditação, deveria ser um meio de passarmos da cabeça para o coração. Os Padres costumavam dizer: conduza seus pensamentos desde a cabeça para o coração e, deixe-os ali. O coração é o centro, onde a cabeça se junta ao restante do corpo e, assim, nossa meditação nos leva da cabeça para o coração e, para todo o ser corpóreo: precisamos meditar com todo nosso ser.

Este é o aprofundamento da harmonia integral de coração, mente, alma e corpo.

Om. Saha Nāvavatu.
Saha Nau Bhunaktu.
Saha Viryam Karavāvahai.
Tejasvināvadhitamastu.
Mā Vidvishāvahai.
Om. Śānti. Śānti. Śāntih.

1 comentários:

Camila Butcher disse...

D.Bede G. sempre me inspira a mais pratica!
Camila B