John Main 1926-1982

Tradução gentilmente realizada e cedida por

Roldano Giuntoli.




Ensinamentos de Silêncio:
A Vida de Dom John Main [1]
por Paul T. Harris

Conhecemos ambas as renovações, litúrgica e bíblica. É absolutamente necessário que tenhamos uma verdadeira experiência de Deus e que conheçamos a renovação na prece.
John Main (1)

Paul Harris é um diretor de Relações Públicas do Governo Federal, em Ottawa, no Canadá, um oblato do priorado beneditino, em Montreal e, foi Diretor Executivo do Centro de Informação Católica, em Toronto.

Desde sua morte, em 30 de Dezembro de 1982, com a idade de cinqüenta e seis anos, os ensinamentos de Dom John Main acerca da meditação cristã, espalharam-se a partir do mosteiro beneditino que ele fundou em Montreal, para abraçar uma comunidade de meditantes de escala mundial. Pessoas de todas as crenças e profissões, desde executivos até donas-de-casa, de especialistas a motoristas de táxi, ouviram o chamado para seguir o caminho do silêncio, da imobilidade, da simplicidade e, do uso de um mantra na prece. Grupos de Meditação estão hoje crescendo na América do Norte e, em todo o mundo, de Nova York, nos EUA a Dublin, na Irlanda, de Londres, na Inglaterra a Melbourne, na Austrália, de Wurzburg, na Alemanha a Arusha, na Tanzânia. Muitas pessoas, percebendo este renascimento contemporâneo da prece contemplativa, começaram a querer se informar acerca da carreira e do desenvolvimento espiritual desse professor extraordinário. Uma recente biografia de autoria de Neil McKenty, In the Stillness Dancing (London: Darton Longman, Todd, and New York: Crossroad, 1987), veio a enriquecer imensamente o que conhecíamos da vida de John Main.

John Main nasceu em 21 de Janeiro de 1926, e passou parte de sua juventude em Londres, na Inglaterra, bem como, em Ballinskelligs, County Kerry, na Irlanda, onde seu pai e seu avô trabalharam para o telégrafo da Western Union. Ballinskelligs pode ter causado uma influência misteriosa, porém oculta, sobre a vida futura de John Main. Perto de Ballinskelligs existe um famoso local em uma ilha, Skellig Michael, um promontório rochoso que se eleva a mais de duzentos metros, próximo à costa de Kerry. Monges irlandeses construíram um eremitério monástico no topo de Skellig Michael no século sexto e, a vida monástica ali continuou por mais de 600 anos.

Há uma questão ainda mais profunda e, uma conjectura ainda mais intrigante. O beneditino John Main leva o crédito de reconhecer e redescobrir os ensinamentos de João Cassiano (360-435) e dos primeiros padres do deserto egípcio, na utilização de frases curtas na oração. São Bento foi profundamente influenciado pelos ensinamentos de Cassiano. Os escritos de Cassiano também tiveram um papel decisivo na vida de John Main.

Cassiano foi para a Provença, na Gália e, levou consigo um novo afluxo de tradições Orientais, com o expresso objetivo de reformar o monaquismo Gálico. A tradição do “mantra” de João Cassiano e dos padres do deserto poderia ter sido implantada em Skellig Michael a partir da Gália? John Main teria alguma vez estabelecido essa conexão? Tenha ele feito isso ou não, é uma hipótese intrigante, a de que o ensinamento do mantra tenha vindo do Egito para a Gália e, dali para Skellig Michael, na Irlanda e, que John Main, que cresceu avistando Skellig Michael, no século vinte, redescobriu essa antiga tradição de prece.

OS PRIMEIROS TEMPOS: O SWAMI
A juventude de Main apresentou relações muito próximas a sua mãe, seus dois irmãos e, suas três irmãs, uma educação com os Jesuítas e na Escola do Coro da Catedral de Westminster, trabalhou como jornalista em Londres e, serviu no tempo da guerra como operador de teletipo no Royal Corps of Signals, na Inglaterra e, na Bélgica. Após a guerra, sua curta vocação com os cânones do Laterano, incluiu um ano de estudos em Roma e, em seguida ele foi estudar Direito no Trinity College, em Dublin.

No entanto, a aventura seguinte o levaria ao Oriente e, iria alterar dramaticamente a vida de John Main e, as incontáveis vidas de outros. Ele se juntou ao British Colonial Service em 1954, sendo destacado para a Malásia. Um belo dia em Kuala Lumpur, ele foi enviado em uma missão aparentemente rotineira, para entregar uma mensagem de apoio e uma fotografia, a um monge hinduísta, Swami Satyananda, diretor de um ashram e de um orfanato-escola. Main pensou que iria se desincumbir rapidamente daquela tarefa ficando livre pelo resto daquele dia. Na verdade, essa visita iria alterar sua vida e, disparar uma busca apaixonada por sua verdadeira vocação.
Tendo cumprido sua missão de apoio, Main pediu ao Swami para que lhe explicasse a base espiritual das muitas obras meritórias que eram levadas a efeito no orfanato e na escola. Imediatamente, Main se deu conta que estava na presença de um homem santo, um professor, um homem do Espírito, cuja fé estava viva, em amor e serviço aos outros. Muitos anos depois ele escreveria em The Gethsemani Talks:
Fiquei profundamente impressionado com sua calma e pacífica sabedoria. Ele me perguntou se eu meditava. Eu lhe disse que tentava e, a seu pedido, descrevi brevemente aquilo que passamos a conhecer como método inaciano de meditação. Ele ficou em silêncio por um breve momento e, então, suavemente, observou que sua própria tradição de meditação era muito diferente. Para o Swami, o objetivo da meditação era o de se tornar consciente do Espírito do Universo que habita em nossos corações. . . em silêncio.(2)

Main ficou tão emocionado com a devoção e a intensidade do Swami, que lhe pediu para que o ensinasse a meditar dessa maneira. O Swami concordou e convidou-o a comparecer a um centro de meditação, uma vez por semana. Em sua primeira visita, o Swami falou acerca de como meditar:
Para meditar você precisa se tornar silente. Você precisa ficar imóvel e, você precisa se concentrar. Em nossa tradição, conhecemos apenas uma maneira de chegar a essa imobilidade, a essa concentração. Nós utilizamos uma palavra, a que chamamos mantra. Para meditar, o que você precisa é escolher essa palavra e, então, repetí-la, fielmente, amorosamente e, continuamente. Isso é tudo o que há acerca da meditação. Na verdade não tenho mais nada a te dizer. E agora, meditaremos.(3)

O Swami ressaltou que, visto que o jovem visitante ocidental era um cristão, ele deveria meditar como um cristão, dando-lhe um mantra cristão. Ele também insistiu que seria necessário meditar duas vezes por dia, de manhã e, à noitinha. Durante dezoito meses, Main meditou com o Swami e, foi esse encontro que o levou à peregrinação da meditação e, a finalmente descobrir a tradição do mantra, tal como ensinada por João Cassiano. Ele não esqueceria nunca essa experiência de santa presença. A própria abertura confiante, que Main possuía em relação às religiões da Ásia, é diretamente atribuível a este monge hinduísta, que o aceitou como discípulo cristão.

VOLTANDO AO OCIDENTE: O MONGE
Findos três anos na Malásia, Main voltou à Irlanda em 1956 para ensinar Direito. Assistia à missa todos os dias e, continuava com sua meditação diária. Em uma visita a Londres, Main reatou sua amizade com Diana Ernaelsteen, de vinte e dois anos de idade, com cuja família ele havia sido alojado em sua adolescência, durante os primeiros anos da guerra. Aquela amizade evoluiu para o amor. Eles se tornaram noivos, mas, Diana pressentiu que o relacionamento deles não poderia se cumprir no casamento. Separaram-se em seguida, porém, permaneceram amigos por toda a vida.

Em 1959, com a idade de trinta e três anos, Main entrou para a Abadia Beneditina de Ealing, em Londres. O diretor espiritual do novo noviço não se dava bem com a “meditação oriental” e, treinado à maneira da oração tradicional, sugeriu que Main rezasse utilizando-se de palavras dirigidas a Deus. Em obediência, Main aceitou o conselho com dificuldade, mas, mais tarde, entendeu a perda da meditação e do mantra, como um passo em direção a uma mais completa libertação.

Em retrospecto, enxergo esse período de minha vida como um período de grande graça. Involuntariamente, meu mestre de noviciado, se prestara a me ensinar o desapego, neste verdadeiro aspecto central de minha vida. Aprendi a me desapegar da prática [da meditação] que me era mais sagrada e, sobre a qual eu estava buscando construir minha vida ... Os anos que se seguiram foram desolados em termos de desenvolvimento espiritual, mas, sempre retornei à obediência, que era a base de minha vida como monge.(4)

Onze anos depois Main aceitou um convite de se tornar o diretor da St. Anselm's Abbey School, em Washington – D.C., nos EUA. Em St. Anselm's, a um rapaz perturbado, ele sugeriu que lesse o livro Holy Wisdom, de autoria de Augustine Baker, um beneditino contemplativo do século dezessete. A influência no jovem foi tão inesperadamente entusiástica, que o próprio Main se dispôs a uma releitura daquele clássico da espiritualidade. Logo, ele e o jovem começaram a meditar juntos, à maneira que Main havia aprendido de seu professor hinduísta. Após sua volta à Abadia de Ealing, em Londres, em 1974, Main perseverou em sua meditação e, em sua pesquisa para descobrir se essa forma de prece possuía raízes cristãs. Main nos conta, "que um freqüente lembrete de Baker quanto à insistência enfática de São Bento sobre as conferências de João Cassiano, foi o que me encaminhou a elas pela primeira vez." No capítulo dez de Cassiano, ele encontrou as raízes que ele estava procurando. O que Cassiano havia aprendido com os padres do deserto (a quem se destinara no século quarto para aprender como orar) e, o que São Bento aprendeu com Cassiano, era o que John Main havia aprendido com o monge hinduísta, três anos antes de se tornar um monge beneditino.

Seguindo-se a essa confirmação, Main recebeu a permissão de fundar em Ealing uma comunidade leiga, a quem passou a ensinar a meditação. Ao não ser eleito abade de Ealing em Julho de 1976, isto e o bem sucedido desenvolvimento da comunidade leiga permitiram-lhe objetivar a possibilidade da criação de uma nova base monástica. Em 23 de Outubro, Main encontrou-se com o Bispo Leonard Crowley de Montreal, no Canadá e, esse encontro finalmente conduziria a um novo mosteiro beneditino naquela cidade.

MERTON E MAIN
Um terceiro ponto decisivo e crucial na vida de John Main se deu durante os poucos dias que passou na Abadia Cisterciense de Gethsemani, em Kentucky, nos EUA em 1976. De fato, seus ensinamentos públicos sobre meditação se iniciaram com as, hoje famosas, três conferências que ministrou aos monges, que foram publicadas sob o título Christian Meditation: The Gethsemani Talks. Porém, foi no período de silêncio que passou no eremitério de Thomas Merton (Merton faleceu em 1968) que o Espírito inspirou profundamente seu coração e o chamou ao trabalho do ensino da meditação. Do eremitério, ele escreveu uma carta a um amigo pessoal, em 13 de Novembro de 1976:
Espero que você esteja bem. Estou hospedado no eremitério de Merton nos bosques que ficam além de Gethsemani. É tão extraordinário o quanto a solidão nos aproxima a todos. Acabei de celebrar a missa mais amorosa de minha vida, na pequena capela de Merton. Vocês todos estavam muito próximos a mim, enquanto rezava por você e toda sua família ... Meu propósito ao vir para cá era o de falar à comunidade acerca da prece, mas, de fato, fui eu que aprendi tanto enquanto estive aqui.(5)

Ele disse aos monges em Gethsemani:
... como a entendi, toda oração cristã é uma crescente consciência de Deus em Jesus e, por essa crescente consciência, necessitamos chegar a um estado sem distrações, a um estado de atenção e concentração, ou seja, um estado de consciência atenta. E, tanto quanto pude determinar, dentro das limitações de minha própria vida, o único caminho que consegui encontrar, para chegar a essa busca, a essa não distração, a essa concentração, é o caminho do mantra.(6)

Neil McKenty, em sua biografia de Main, sublinha a significação da experiência de Main em Gethsemani:
Seria de se admirar que o Pe. John tivesse se comovido tanto com sua experiência ali? Ele sabia o quanto Thomas Merton fizera, em sua vida e em sua produção literária, para fazer tantas pessoas pensarem acerca da prece, tantas pessoas querem rezar. Pe. John também sabia que Merton, mais do que qualquer outro, havia trilhado um caminho para o Oriente, um caminho que havia auxiliado a própria peregrinação de John Main. Não pode haver muita dúvida de que quando Pe. John estava, de pé em silêncio, no altar do eremitério de Merton, ele compreendeu o outro peregrino que havia chegado com o mestre. E, a experiência de falar com os monges de Gethsemani se tornou um ponto decisivo para John Main, uma motivação inescapável para prosseguir em sua própria jornada, para esclarecer seus próprios ensinamentos sobre a prece e, para falar sobre ela a quem quer que quisesse ouvir.(7)

Outros autores fizeram menção ao papel fundamental representado por ambos Merton e Main, no revigoramento contemporâneo da prece cristã. Num recente artigo, o autor Gregory J. Ryan nos diz:
Deveríamos notar, de início, que nem Thomas Merton, nem John Main viveram em um nível teórico. Cada um deles viveu a partir das profundezas de seu coração e, é precisamente esta característica que representa um modelo para todas as mulheres e homens de nosso tempo. É essa a razão pela qual a popularidade e a influência de Merton continuam a crescer. É essa a razão pela qual a comunidade monástica de John Main tem crescido para incluir monges e freiras, residentes leigos e hóspedes, membros oblatos de diversas afiliações religiosas e, meditantes em todo o mundo, que seguem seus ensinamentos sobre a prece.
Ambos os monges concordariam que a doença que aflige nosso mundo de hoje é um enlouquecido materialismo moralmente falido, um tipo de “doença cardíaca” da sociedade. Eles também concordariam que a cura deve ser encontrada por meio de uma redescoberta do que é que nos torna humanos. A receita para essa convalescença, é a prece. (8)

Ao deixar Gethsemani, Dom John disse aos monges: “Me lembrarei sempre com muito afeto desses dias que passei com vocês.”(9) “Ele havia aprendido que seus ensinamentos no caminho da prece deveriam prosseguir com maior urgência do que jamais havia sentido”, nos diz McKenty. “Ele também havia aprendido, sem sombra de dúvida, que esse era o trabalho pelo reino para o qual ele havia sido chamado a dedicar o resto de sua vida, não importando o quão longa ou curta ela pudesse vir a ser.”

Quão próximos estavam Thomas Merton e John Main, em sua peregrinação? Pareceriam muito próximos. Estas são as notáveis palavras de Merton em Calcutá, na Índia, alguns dias antes de sua morte:
... O mais profundo nível de comunicação não é comunicação, mas, comunhão. Ela prescinde das palavras. Ela está além das palavras e, além dos conceitos. Não se trata de descobrirmos uma nova unidade. Descobrimos uma unidade mais velha ... já somos um. Mas, imaginamos que não somos. E, o que precisamos recuperar, é nossa unidade original. O que precisamos ser, é o que somos.(10)

McKenty ressalta que, ainda que Merton e Main estivessem ambos próximos em seu pensar a prece, havia diferenças em sua abordagem e ênfase.

Merton escreveu muito sobre a prece; ele todavia, escreveu muito pouco sobre sua vida de prece pessoal, ou como ele lidava com isso. Main, na maior parte do tempo, estava escrevendo sobre sua própria prece. Merton era mais um escritor; Main mais um homem de ação .... Os escritos de Main, que quase exclusivamente ressaltavam a meditação cristã, pareciam transcender sua personalidade .... John Main nos deixou um ensinamento formal acerca de como orar. Thomas Merton, não.(11)

O ENSINAMENTO
A genialidade de John Main leva o crédito da síntese dos ensinamentos de João Cassiano e dos padres do deserto, sobre a prece, da Nuvem do Não Saber, dos ensinamentos espirituais da Ásia e, de deixar um ensinamento formal sobre a prece, para os tempos atuais. Também é exclusiva de Main, a enfatização de que a meditação e a contemplação eram um chamado a todos. Até mesmo Thomas Merton, em seus primeiros escritos, sentia que a prática da contemplação era uma prerrogativa espiritual de religiosos profissionais de ordens contemplativas, como a dos cistercienses. Ele modificou sua visão anos mais tarde. Onze anos antes de sua morte, em 1968, Merton passara a se utilizar de um mantra, a “Prece de Jesus”, da tradição cristã oriental.(12)

Os ensinamentos de John Main sobre como orar, eram muito simples: sente-se, fique imóvel com a coluna ereta, feche suavemente os olhos e repita seu mantra. O mantra é simplesmente uma palavra sagrada, ou frase, que se repete continuamente, fielmente, por toda a meia hora da meditação, toda manhã e todo fim de tarde. Ele insistia com pessoas de todas as camadas sociais, para que reservassem dois diferentes períodos de vinte a trinta minutos, todos os dias. Ele sugeria que a pessoa encontrasse uma posição confortável para se sentar. Ele dizia:
“Na meditação, você deveria procurar uma palavra que tenha sido consagrada, ao longo dos séculos, por nossa tradição cristã. Uma delas, é a palavra “maranatha” ... que quer dizer, “Vinde Senhor, Vinde Senhor Jesus”. É a palavra que São Paulo utiliza para encerrar sua primeira epístola aos Corínthios. Essa palavra-prece se recita silenciosamente, interiormente, em quatro sílabas igualmente destacadas MA-RA-NA-THA. A velocidade é razoavelmente lenta e, razoavelmente rítmica. Algumas pessoas repetem a palavra em sintonia com sua respiração calma e regular.(13)

Main ressaltou que a pessoa que medita deveria repetir o mantra durante todo o período de meditação. “Iniciamos repetindo o mantra mentalmente. . .então, o mantra passa a não ressoar tanto em nossa mente, quanto em nosso coração. . .então, ele parece se enraizar nas verdadeiras profundezas de nosso ser.” (14) Dessa maneira, do pensar acerca de Deus, a pessoa passa a simplesmente estar com Deus. Em adição, Main ressaltou que a meditação se torna um processo de auto-descoberta, integrando o próprio corpo, mente e espírito.

Tanto em seus livros, quanto nas gravações de suas palestras, John Main delineou seus “ensinamentos de silêncio” sobre a meditação:
Ouça o mantra à medida que você o repete, suave, porém, continuamente. Você não deve pensar ou imaginar nada, espiritual ou não. A meditação nada tem a ver com quietude sonhadora ou imobilidade passive, mas, com atenção plenamente acordada. Caso ocorram pensamentos ou imagens, eles são as distrações do período de meditação, portanto, simplesmente volte a repetir sua palavra. Ignore simplesmente e, a maneira de ignorar, é repetir seu mantra. Retome com fidelidade a meditação, a cada manhã e fim de tarde, por um período de vinte a trinta minutos.

O SIGNIFICADO DA MEDITAÇÃO
A meditação é uma peregrinação a nosso próprio centro, ao nosso próprio coração. Todavia, necessitamos fé, simplicidade e, necessitamos nos tornar como crianças. Adentrar a simplicidade dela, requer disciplina e, até mesmo coragem.

Caso tenhamos fé e paciência, a meditação nos levará a mais e mais profundos reinos de silêncio. É nesse silêncio que somos conduzidos em direção ao mistério do silêncio eterno de Deus. Aquele é o convite da prece cristã, para nos perdermos a nós mesmos e, sermos absorvidos em Deus. Cada um de nós é chamado às alturas da prece cristã, para a plenitude da vida. O que precisamos, entretanto, é da humildade para trilharmos o caminho muito fielmente, por um período de alguns anos, de modo que a prece de Cristo possa, de fato, ser a experiência fundamental de nossa vida.

A meditação é um dom de proporções tão incríveis, que necessitamos nos desenvolver nela gradualmente, suavemente. De início, não conseguimos compreender plenamente a pura magnificência e maravilha dela. Cada vez que voltamos a meditar, adentramos aquela realidade um pouco mais profundamente, um pouco mais fielmente.

Em vista do fato de que a meditação nos conduz a uma experiência de amor no centro de nosso ser, ela nos torna pessoas mais amorosas, em nossas vidas e nos nossos relacionamentos comuns. A meditação não é apenas o fundamento necessário para a ação contemplativa, mas, é a condição essencial para uma resposta à vida, plenamente humana.

A maravilhosa beleza da prece está no fato de que, o abrir de nosso coração, é tão natural quanto o abrir de uma flor. Para permitirmos que uma flor se abra e desabroche, só precisamos deixá-la ser; portanto, ao simplesmente ser, caso nos tornemos e permaneçamos imóveis e silentes, nosso coração só poderá se abrir; o espírito só poderá se derramar em todo o nosso ser. É para isso, que nós fomos criados. (15)

Com relação ao termo “meditação” o autor Gregory Ryan ressalta:
Desde os primeiros dias do Centro de Meditação que ele havia iniciado na Abadia de Ealing, em Londres, antes mesmo de fundar a Comunidade de Montreal, Pe. John insistia em denominar essa forma de prece de “meditação”. Era a sua maneira de, indiretamente, pacificar qualquer confusão ou mal-entendido concernentes à prece em geral. Em um dos muitos artigos emitidos a partir do mosteiro, que foram posteriormente reunidos e publicados, ele abordou esse aspecto.
Essa confusão frequentemente manifestava-se primeiro como um entendimento errôneo da própria palavra meditação. Sabíamos, é claro, que a estávamos utilizando em seu sentido original, monástico, de prece sem imagens. E, sabíamos que esse significado colidia com o significado mais genérico que a meditação possuía, nos círculos cristãos, de prece discursiva com grande ênfase no uso da imaginação. Por outro lado, a maioria de nossos contemporâneos, especialmente os de geração mais jovem, entendiam, por meditação, exatamente aquilo que queríamos dizer....(16)

Em Setembro de 1977, atendendo a um pedido do Bispo Crowley, Main e o irmão Laurence Freeman saíram de Ealing para estabelecer o Priorado Beneditino de Montreal. No verão seguinte, Main descreveu sua visão da comunidade que queria construir, em uma carta: “uma comunidade de monges, irmãs, comunidade laica, pessoas casadas e famílias, todos reunidos pela meditação, obviamente com diferentes níveis de comprometimento, mas, com um crescente comprometimento”.(17)

Quando Main faleceu, em 1982, o único elemento dessa visão que ainda não se tornara (mas, logo se tornaria) realidade, era o estabelecimento de uma comunidade religiosa de mulheres.
Dom Laurence Freeman, Prior da Comunidade de Montreal desde o falecimento de Padre John, nos conta: “Muitos anos antes de se tornar monge, Pe. John costumava falar a amigos quanto a dar início a um novo tipo de comunidade que iria atender uma profunda carência de irmandade, unicidade de coração e de mente, que todas as pessoas sentem, não apenas os religiosos .... Ele a chamava “uma comunidade de amor”.” Na realidade, ela seria uma comunidade com monges em seu núcleo, a quem se uniriam muitos outros homens e mulheres com variados níveis de comprometimento, na medida da possibilidade de suas situações de vida individuais. Os próprios monges iriam encontrar no mosteiro: “…um local onde são chamados a viver em liberdade, para desenvolvê-la e comunicá-la a outros.” (18)

De acordo com Gregory Ryan, o novo mosteiro fundado por John Main e Laurence Freeman não estava limitado por nenhuma espécie de usos e costumes longamente estabelecidos, assim, lançou profundas raízes no espírito do monaquismo beneditino primitivo, de modo a encontrar suas diretrizes. Em razão da genialidade de São Bento, cuja Regra é atemporal, isso se transformou em uma antecipação do futuro. Os monges desse mosteiro não iriam viver isolados de outras pessoas, por uma razão básica, a mesma que Thomas Merton reconhecera anos antes: “... a comunidade monástica tem o dever, para com os outros, de compartilhar [sua] quietude e isolamento”.

Esse “compartilhar” tomou a forma de pequenos grupos de meditação, que se reúnem uma vez por semana, para adentrar a experiência da meditação, constituindo-se, eles mesmos, em um meio para que novatos aprendam esse tipo de prece. Por influência do crescimento do cristianismo durante os primeiros dias da igreja, Main vislumbrou pequenos grupos espalhando o ensinamento da meditação de uma forma orgânica, encontrando-se em várias localidades, uma vez por semana e, proporcionando apoio motivacional e encorajamento aos que estão na peregrinação meditativa. Ele não viveu para ver o atual crescimento de escala mundial dos sessenta e cinco grupos de meditação no Reino Unido, trinta e cinco grupos de meditação na República da Irlanda, quarenta e cinco grupos na Austrália, cinqüenta e três grupos no Canadá e, grupos de meditantes em cidades e vilarejos de muitos outros países do mundo.

O Pe. John Main morreu de câncer na manhã do dia 30 de Dezembro de 1982, irradiando uma sensação de presença e de paz e, rodeado por sua comunidade monástica beneditina e, por meditantes de Montreal. Ao resumir a vida e ensinamentos de Main, François C. Gerard, um ministro da United Church of Canadá, escreveu em Monastic Studies: "...se precisássemos caracterizar em uma frase os ensinamentos e a peregrinação espiritual de John Main, poderíamos sugerir que ele redescobriu e vivenciou a simplicidade do evangelho."(19)

De acordo com Gerard, Main assumiu o papel de profeta de nossa geração, lembrando-nos que, para estar com Deus, não são necessárias palavras, pensamentos, ou o discurso, mas, a silenciosa consciência de uma Presença. John Main nos lembra que nossa peregrinação espiritual não terá futuro, a menos que tenhamos a coragem de nos tornar mais e mais silentes. De fato, nossa jornada interior nem mesmo se iniciará, a menos que estejamos dispostos a aceitar a disciplina do silêncio.

Pouco antes da morte de John Main, um meditante de Londres ressaltou que o ensinamento de Dom John Main lhe trazia à memória as seguintes estrofes da poesia “Quatro Quartetos” de T. S. Eliot[2]:

Eu disse a minh'alma, fica imóvel, e espera sem esperança Pois a esperança seria esperar pelo equívoco; espera sem amor Pois o amor seria amar o equívoco; contudo ainda há fé Mas a fé, o amor e a esperança permanecem todos à espera. Espera sem pensar, pois que pronta não estás, para pensar: Assim a treva em luz se tornará, e em dança há-de a imobilidade se tornar.

Finalmente, nas palavras de Neil McKenty, biógrafo de John Main, "...na morte de John Main, na treva havia luz e, dança na imobilidade."

NOTAS
1. Communitas Tapes: Palestras do Pe. John Main.
2. Christian Meditation: The Gethsemani Talks (Priorado Beneditino de Montreal, 1977), pg. 10.
3. Ibid., pg. 12.
4. Ibid., pg. 15.
5. Carta a Lady Rosamund Lovat, 13 Nov. 1976.
6. Christian Meditation, pg. 43.
7. Neil McKenty, In the Stillness Dancing (London: Darton, Longman and Todd, 1985), pg. 101.
8. Gregory J. Ryan, Meditation in a World of Action -- Merton, Main, and the New Monasticism (ensaio impresso privativamente).
9. Christian Meditation, pg. 56.
10. Michael Mott, The Seven Mountains of Thomas Merton (Boston: Houghton, Mifflin, 1984), pg. 545.
11. McKenty, pg. 100.
12. Thomas Merton, The Hidden Ground of Love (Letters) (New York: Ferrar, Straus and Giroux, 1985), pg. 392.
13. Communitas Tapes.
14. Ibid.
15. Ibid.
16. Gregory J. Ryan, op. cit.
17. Carta a Lady Rosamund Lovat, Julho 1978.
18. McKenty, op. cit.
19. Monastic Studies (Advent, 1984), pg. 71.
20. London: Faber and Faber, 1944, pg. 19.
21. Maiores informações acerca dos métodos de meditação de John Main, poderão ser obtidas do Priorado Beneditino de Montreal, 1475 Pine Avenue West, Montreal, Quebec, H3G 1BE. [3]

[1] N.T.: O original em inglês foi extraído da web em: http://www.spiritualitytoday.org/spir2day/884043harris.html
[2] N. T.: Thomas Stearns Eliot (1888-1965) poeta de veia mística, nascido nos EUA, escolheu a Inglaterra para viver.
[3] N.T.: Sites da Comunidade Mundial de Meditação em língua portuguesa podem ser encontrados em: http://www.wccm.com.br/; http://wccmbr.blogspot.com/ e http://wccmportugal.blogspot.com/

0 comentários: